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    "O 'negócio fitness' ficou inviável com o advento das academias low-cost", disse-me um amigo em recente comentário num dos posts da 4GOAL. Vocês concordam?

    Para mim, o que inviabiliza muito negócio é:

    - a gestão financeira amadora;

    - pouca habilidade nos processos de compra e negociação com fornecedores;

    - descuido com a gestão de pessoas e de processos internos (vendas, entrega de serviços, monitoramento de consumo, reversão de crise...);

    - desinteresse em desenvolver estratégias para novos canais de vendas (online, por exemplo) e de entrega;

    - desconhecimento da importância do branding.

    E se toda essa negligência já 'inviabilizou' o mercado de fitness tal qual o conhecíamos, imaginem agora com a era da Educação Continuada, investimento promovido em diversos segmentos, mas ainda totalmente desdenhada pelo nosso setor?!

    Logo, minha expectativa pra 2019: quem não se ligar de que o mundo das academias como conhecíamos antes mudou, deixará de existir. Não importam apenas os fatores externos. São os processos internos que estão nas nossas mãos e que precisam ser modificados.

    Por exemplo, sobre o tema retenção. Quem aqui tem problema com retenção? Como os amigos entendem retenção? Quão são os indicadores que determinam uma retenção positiva e quando é que o alerta é ligado?

    Vocês já se deram conta de que vendemos ASSINATURA?

    Se vendemos assinatura, o nosso papel é fazer com que o cliente use, perceba valor e tenha desejo de continuar usando no futuro.

    Escrevi um artigo científico sobre o tema. Eis um pequeno recorte:

    “A observação da frequência do cliente de prestadores de serviços recorrentes, tais como telefonia móvel, assinaturas de TV a cabo e acesso à internet, e seu comportamento de abandono aos serviços, vem sendo feita com consistentes resultados que comprovam a relação causal entre menor frequência de uso e cancelamento ou não renovação do contrato ora vigente (Bonfrer, Knox, Eliashberg & Chiang, 2007). Sua percepção quanto ao volume de uso, se verificada abaixo do que considera adequado ante o investimento feito, poderá ser um preditivo para a tomada de decisão de não manter a relação comercial ativa (Munaier & Costa, 2019).

    O que isso tudo tem a ver com o nosso mercado? Vamos lá, me respondam: qual é a frequência média semanal dos clientes da sua academia? Vocês mensuram?

    Mensuramos os clientes com comportamento de evasão. Em comum, a baixa frequência. Mas vejam que coisa maluca: a alta frequência não quer dizer, necessariamente, renovação! A alta frequência pode significar aderência à atividade física. Não quer dizer que o cliente irá continuar a praticá-la na sua academia, ao término do plano. Sacaram?

    Baixa frequência = evasão. Ponto! Nesse aspecto, seu papel é monitorar a frequência e garantir que o cliente frequente!

    Alta frequência = adesão à atividade física. Se ele continuará ou não na sua academia, dependerá do VALOR que ele dá às experiências vividas na sua academia.

    VALOR

    Vamos a mais um trecho do meu artigo científico?

    Lursch e Vargo(2006), bem como Lusch, Vergo e O’Brien (2007), propõem a inversão de papeis na construção de valor do produto: o protagonismo passa a ser do consumidor e das experiências vivenciadas por ele na utilização do produto, quando se dá o processo de construção do valor. Até então, a perspectiva dominante centrada no produto, e não na experiência de utilização do consumidor, reservava a ele, consumidor, um papel passivo de aquisição e consumo. Ainda neste sentido, Falcão, Mazzero, Campomar e Toledo (2016) reforçam a premissa da relação subjetiva entre benefícios percebidos e sacrifícios percebidos na constatação do valor que o produto assume para o consumidor. Dentre os sacrifícios, “os custos suportados pelo comprador ao realizar uma compra: preço, tempo, energia física e energia psíquica” (Munaier & Costa, 2019).

    Traduzindo em miúdos: o que faz o seu cliente ficar na academia é:

    - USAR;

    - VIVER EXPERIÊNCIAS POSITIVAS;

    - SE PERCEBER USANDO E VIVENCIANDO ESSAS EXPERIÊNCIAS POSITIVAS NO FUTURO.

    E aí, resgato as perguntas originais: quem aqui tem problema com retenção? Como os amigos entendem retenção? Quão são os indicadores que determinam uma retenção positiva e quando é que o alerta é ligado?

    A gente confunde, por exemplo, satisfação com retenção. NÃO! Quantos relacionamentos vocês já terminaram, mesmo a pessoa sendo bacana, a família adorava, etc., mas você não se via com a pessoa no futuro?

    E o que vocês têm feito para garantir:

    - USO;

    - EXPERIÊNCIAS POSITIVAS NO USO;

    - SE PERCEBER USANDO E VIVENCIANDO ESSAS EXPERIÊNCIAS POSITIVAS NO FUTURO.

    O nosso papel é promover a co-criação de valor (empresa e cliente criam o valor de forma conjunta) e monitorar o uso.

    Vou dizer pra vocês o que eu tenho feito e me digam se vocês já fizeram isso. Pode ser?

    Quantos de vocês organizaram Focus Group com clientes (de forma profissional, com coleta e transcrição das reuniões), em diferentes horários, e registraram o que os clientes identificam de valor na relação com a academia, e como essas experiências justificam, pra elas, o esforço psíquico e físico de pagarem e frequentarem a academia?

    “Christian, explica melhor esse Focus Group?”

    Focus Group é uma técnica da pesquisa científica - e também usada pela turma do marketing - para, em grupo, ouvir as pessoas sobre um determinado tema, sentimentos, experiências... Fazem isso desde a década de 1950. As novelas da Globo fazem isso. Os filmes da Disney fazem isso. As montadoras de carro fazem isso. Políticos fazem isso. Academias NÃO fazem isso.

    Vou piorar... Posso?

    Se retenção é uso, experiências positivas e expectativa de uso no futuro, a primeira compra, ou seja, as promessas feitas pela equipe comercial e pela comunicação da academia contam. A primeira compra é uma promessa. Se não cumprimos, eles podem não renovar esse voto de confiança. Assim, pergunto: vocês já compararam o discurso de vendas da equipe comercial com a percepção do cliente do que ele recebeu?

    A resposta clara é: não! Se não há focus group com os clientes, não há como comparar o discurso com a percepção.

    AÇÕES PRÁTICAS:

    USO

    Mensurar semanalmente o comportamento de uso do cliente da academia e interferir no comportamento dos que vêm menos de 2 vezes por semana.

    EXPERIÊNCIA DE USO

    Mensurar, através de Focus Group (entre outras ferramentas), a percepção das experiências do cliente e repensar esse fluxo de experiências.

    Sabem o que é mais louco? Muito do que coletamos em focus group é super positivo e nos ajuda a melhorar o discurso de vendas da equipe comercial, bem como as peças publicitárias.

    É de uma riqueza absurda promover o focus group. Muda absurdamente o treinamento de vendas. NÃO DÁ MAIS PARA FAZER AQUELE TREINAMENTO DE VENDAS BÁSICO... É bla-bla-blá. Treinamento de vendas do séc. 21 leva em consideração as experiências que os clientes vivem, de fato na academia. Porque, de toda forma, essas experiências estão sendo compartilhadas nas mídias sociais e muitos dos seus potenciais clientes já leram.

    E sabem quem mais precisa ser ouvido?

    Vejam:

    - site e estratégias de marketing comunicam oficialmente as experiências que queremos entregar;

    - equipe comercial faz uma oferta de valor para essas experiências...

    Quem tá faltando? A equipe técnica, claro! Pois é a equipe técnica que valida, dia a dia, a promessa de experiências feita institucionalmente e pelo departamento comercial.

    Vejam que maluquice: na era da co-criação de valor, as experiências vividas pelo cliente são decorrentes:

    - de uma primeira expectativa de experiências advindas da comunicação institucional

    - das promessas feitas pelo departamento comercial

    - do entendimento, por parte da equipe técnica, do que é e como é para ser entregue

    O que eu tenho feito? Medimos o uso e checamos as experiências!

    A mensagem que eu quero passar pra vocês neste artigo: não dá mais para pensar em gestão de serviços sem ter, na sua centralidade, as experiências vividas e percebidas pelos clientes. Sem ouvi-los, continuaremos às cegas!

    Não dá para nos enxergar como empresa que vende assinatura sem entender que a gestão do século 21 é a gestão de assinaturas. E a essência da assinatura está no uso. Lembre-se do Netflix e de suas comunicações diárias sobre o que ele recomenda você assistir todos os dias. Gestão do uso.

    Sete ações da empresa alinhada às experiências de uso do cliente no séc. 21

    1. Gerencie o uso: semanalmente;

    2. Conecte: coloque seu time para contactar clientes com frequência menor que 2X/ semana;

    3. Focus Group: não negligencie o olhar sobre as experiências que o seu cliente vive. Pois ele poderá decidir não vivê-las na sua academia;

    4. Ouça seu time: alinhe o discurso do seu time com o que seu cliente percebe de valor. Tire as pedras do caminho;

    5. Mensalmente, analise o comportamento de evasão dos clientes;

    6. Modifique as experiências que se fizerem necessário;

    7. Isso é pra sempre!

    * Christian Munaier é IHRSA Associate Member, American Marketing Association Member, sócio-proprietário da academia AQUAFAN (Brasília/DF), sócio-consultor da 4GOAL Business Solutions (América Latina e Portugal) e autor do livro Gestão Consciente da Ginástica Coletiva. Graduado em Gestão pela Fundação Getulio Vargas (FGV), é pesquisador CAPES no Mestrado em Administração na PUCSP, linha de pesquisa: Comportamento do Consumidor. É Professor da Saint Paul Escola de Negócios no MBA em Liderança e Gestão, chancelado pela European School of Management and Technology – ESMT Berlin.Sete ações da empresa alinhada às experiências de uso do cliente no século 21.