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    A situação pandêmica levantou uma série de questionamentos sobre o modo de vida que levamos, especialmente sobre nossa saúde e bem-estar. Uma pesquisa do Instituto Paraná Pesquisas mostrou que a saúde pessoal e da família é a maior preocupação de 66,9% dos brasileiros em meio ao cenário que vivemos. E quando falamos em terceira idade essas condições são ainda mais complexas, afinal este é um grupo de risco que precisa ter um cuidado redobrado com a saúde. 

    Com o crescimento da população idosa, o Brasil vive um período de transição etária da população, e mesmo assim, a prática da atividade física em idosos ainda é pouco difundida no mercado fitness. 

    Diante dessa realidade, conversamos com Maria Alice Corazza, professora da FMU e escritora do livro “Terceira Idade & Educação Física” que há mais de 50 anos contribui trabalhando com a saúde física de idosos do Brasil, e Mauro Guiselini, doutor em Educação Física, professor e escritor para entender como os idosos estão lidando com a situação de isolamento social e como você, gestor pode explorar esse mercado, focando no bem-estar e da terceira idade em tempos de pandemia. 

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    À medida que a expectativa de vida da população vem mudando, a percepção que temos sobre a realidade e a qualidade vida de cada grupo etário caminha junto. O Brasil passou por uma série de transformações sociais, culturais e tecnológicas que proporcionaram mais qualidade de vida, e consequentemente mais longevidade para a população:  

    “Acompanho esse mercado há 51 anos, quando eu iniciei era muito ruim, eu fui aprendendo com os idosos, vendo suas necessidades. Na década de 70 nem existia a ideia de “terceira idade”. Era ruim porque ninguém sabia o que ia acontecer com o crescimento da população idosa, mas as coisas melhoraram com o desenvolvimento de medicamentos específicos, clínicas de fisioterapias que começaram a prevenir doenças, os professores de educação física começaram a entender que era importante,” comenta Corazza.  

     Atualmente, ao observar as diversas realidades que convivem, em um país continental como o Brasil, o fator classe social impacta diretamente na qualidade de vida do idoso, quando este possuindo mais recursos ao seu alcance, tem a capacidade de escolher quais atividades poderá exercer, além de possuir maior suporte, tanto para realizar atividades físicas quanto para ter um acompanhamento médico:  

    “O Brasil é um país de muita diversidade, e em breve teremos um grande número de idosos. Diante disso, temos diferentes nichos: idosos em boa condição socioeconômica e outros nem tanto. Hoje, uma boa parte da população tem acesso aos cuidados médicos e planos de saúde e podem até ir para uma casa de repouso. É bem diversificado, porém existe muita desigualdade social.” – analisa Mauro Guiselini.   

    Portanto, a realidade mostra que a maioria dos idosos não praticam atividades físicas. Por esse motivo, a terceira idade fica mais propensa a desenvolver doenças relacionadas ao enfraquecimento do corpo e a redução da massa muscular, característica natural do envelhecimento, fazendo com que o idoso tenha maior risco de sofrer quedas e ocasionar lesões e fraturas agravando suas condições de vida:  

    “O que nos preocupa muito é o alto índice de sedentarismo no idoso, que é muito grande no Brasil. Em função desse sedentarismo, eles trazem consigo as comorbidades decorrentes desse pouco movimento. Isso atrapalha bastante a saúde do idoso.” – comenta Mauro Guiselini.   

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    Mesmo aqueles idosos que se sentiram incentivados de alguma maneira a praticar atividades físicas, seja para caminhar de manhã na rua de casa, ir aos clubes públicos fazer aulas experimentais ou até mesmo nas academias tiveram sua rotina interrompida radicalmente com a chegada da pandemia. Essa mudança brusca na vida do idoso, que geralmente está acostumado com uma rotina bem determinada causa um impacto muito grande também em seu emocional de forma negativa, comenta Corazza:  “É desesperador para o idoso ficar em casa. Quando a gente envelhece se apega muito a religião, quer sair, quer ir ao banco e agora estão todos trancados em casa. É desesperador, principalmente os idosos que moram sozinhos. No começo foi muito sofrido. Fiquei preocupada porque não é só a parte física, mas o emocional estava sendo afetado e dando um link para a parte física”. 

    A falta de inclusão digital também contribuiu para que as aulas online fossem introduzidas de maneira mais efetiva na nova rotina, já que a maioria dos idosos não possui muita aptidão digital: 

    “Foi difícil. Mando individualmente os treinos, mas o máximo que eles tem é um WhatsApp, é difícil levar para o Facebook ou outras mídias. No começo, comecei a fazer as lives e se precisassem de exercício poderiam falar comigo, deixei meu WhatsApp. Falava com eles diretamente. Alguns professores ficam até mesmo na porta da casa dos alunos, tudo depende da criatividade de cada profissional. A tecnologia ajudou, para aqueles que já conhecem o celular e tem facilidade. Minha preocupação é que eles continuem e não parem, não desistam de se exercitar. O idoso gosta muito de caminhar e segurá-los em casa é difícil,” comenta Corazza.  

    Ainda assim, praticar atividades físicas em casa sem a devida orientação traz alguns riscos para a saúde do idoso, que pode distender algum músculo se realizar o exercício de forma incorreta ou acabar com uma lesão por forçar demais as articulações. Entretanto, os profissionais precisam estar atentos, de forma a orientar os praticantes de forma a evitar ao máximo esses riscos. Guiselini refuta: 

    “Ficar parado é mais perigoso do que fazer alguma coisa, o grande problema que eu vejo, é que hoje os aplicativos e redes sociais fazem apologia a treinamentos muito intensos. O alongamento é fundamental para as articulações que ficam enrijecidas. É preciso pensar em funcionalidade para exercícios em idosos já que as pernas são enfraquecidas, e a maioria dos idosos sedentários têm dificuldade em levantar-se de cadeiras, subir escadas. É importante fazer exercícios leves para fortalecer, promover força e equilíbrio que o idoso perde, ficando mais propenso a quedas. Como o idoso fica tenso, é preciso incluir também exercícios respiratórios para eles relaxarem.”

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    Outra função muito importante que a prática de atividade física tem realizado na terceira idade é a socialização. Muitas vezes os idosos possuem uma vida solitária, moram sozinhos, e os filhos quase não visitam. O idoso nessa situação vê na ida à academia, nas aulas de ginástica, de dança em grupo, a possibilidade de se divertir e fazer amizades. A impossibilidade de participar dessas atividades traz muita angústia emocional. Corazza reafirma a importância de gerar esse estímulo na vida do idoso, mesmo a distância:   

    “Hoje tenho uma ferramenta muito boa: a música. Fazer aulas temáticas (anos dourados, ginástica cantada) oferece ferramenta. Era um desafio que eu estava enfrentando, mas encontrei a solução através do estímulo dos temáticos. Eles gostam de música e isso incentiva.”  

    Em relação ao mercado o suporte para o idoso ainda é controverso. Ao mesmo tempo em que as academias possuem cada vez mais tecnologias, com aparelhos de ginástica de última geração, atividades novas focadas em cada função corporal, os idosos sendo um grupo de risco ficam muito propensos às doenças e ao coronavírus. Para Guiselini mesmo com o retorno gradual das atividades, o idoso ainda vai demorar a sair de casa:  

      “Estamos vivendo um período de muito medo. O idosos requer mais cuidados por ser do grupo de risco. As academias estão se preparando, se organizando, com as medidas propostas pela ACAD. Eu vejo que no mundo, enquanto não tivermos uma vacina, vamos viver no medo. Eu espero que os idosos voltem para os centros esportivos, guardando os devidos cuidados. Infelizmente eu vejo que até o final do ano vamos ficar nesse vai e vem, idosos em casa, personal online. O treinamento online veio pra ajudar. Tenho uma aluna com 60 anos que é grupo de risco, não posso ir à casa dela, então estou fazendo online. Eu acredito que vamos ter um período triste para os idosos, que terão que esperar um pouquinho mais.” 

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    Com o envelhecimento da população brasileira, vivemos no embate do quanto o mercado está preparado para conversar com o público idoso do futuro. Entretanto, para Mauro Guiselini essa transição já está acontecendo à medida que esse assunto vem sendo trabalhado entre os idosos, conscientizando sobre a importância da prática do exercício físico:  

    “É um grande mercado sem dúvidas, existem planos de saúde só para terceira idade, turismo para idoso, vários mercados estão se adaptando. É uma união, a medicina geriátrica é uma medicina avançada e difundida. A mídia e a medicina estão mostrando a importância do exercício para o idoso. Existe problemas que se resolvem apenas com exercício. O exercício hoje faz parte. O que as pessoas que vivem mais têm em comum: todos os longevos são ativos. Isso significa que o exercício, academia para o idoso, os programas são importantes. Eu vejo como um mercado que já está no presente.”